dezembro 25, 2009

Feliz natal, Timoneiro

Se ainda é de regressos que falo, hoje é um dia de regressos. A esta hora as estradas voltam a encher-se de lágrimas secas que voltarão a desabrochar daqui a um ano. É dia de ouvir histórias que já conhecia - de quando não tinha a consciência delas mas já delas era eu parte. O meu avô delicia-se a contar as duas, cinco histórias que eu protagonizei. E eu não me canso delas; como se de cada vez que as contasse regressássemos os dois um bom par de anos atrás – e nisto os meus olhos nos dele vão desenhando os contornos do que tenho a certeza que vi, mas do qual não me lembro. E hoje voltamos lá. A uma altura em que aquele abraço forte e bom ainda lá estava e eu, se adivinhasse o fim dele, esquecia-o. Abençoada seja a capacidade de esquecermos o peso dos dias - ou na falta do esquecimento, de nos distrairmos o tempo suficiente para permitir o sorriso.

Há um ano atrás perdi um amigo. Não fora a bênção do esquecimento, nem forças me restavam para respirar. Não me sentei ao lado dele para que a memória não me roubasse o coração - se pudesse escolher o dia que seria a morada da minha memória, teria que voltar tantas páginas do calendário quantas há as que se foram amontoando nos meus ombros. E talvez à chegada… quisesse apenas partir.

A esta hora o covil está vazio. Os meus irmãos partiram cada um para seu lado. É uma caçada de lágrimas. A esta hora, a madeira das guitarras encolhe-se para envolver as cordas, as teclas do piano tornam-se cinzentas de tão próximas, a resina no arco do violino desvenda segredos do frio e a pele do bombo fica mais grave. A esta hora cada uma dessa parte de nós fica guardada. É uma caçada de lágrimas.

Feliz natal, Timoneiro.

JoaoRui

dezembro 22, 2009

Ultimos uivos antes do Natal

O frio parece ter vindo para ficar. Este foi um fim de semana de costas voltadas para norte e peito aberto em direcção ao sul. Encontrámos caras conhecidas, mas na maioria desconhecidas que vieram receber o Lobo. O ultimo uivo antes do Natal. Quando regressarmos será para partir...
Sentado à janela do décimo segundo andar que dava para as bandas do mar, observei a chegada do frio. A minha mãe falou-me em promessa de neve.
Mas não, era apenas frio, talvez gelo ou vento - sussurrou ao meu ouvido que era memória de infância; de décadas das quais guardo os meus retratos imperfeitos. O dia a estender os braços por cima de um manto de neve - os passos mais nervosos que ilusão e o coração a ansiar por um retrato.
Felizmente não há fotografias para avivar a memória. Assim não tenho provas instantâneas desse momento - não sei se os atacadores dos sapatos estavam desapertados, se o cabelo estava despenteado ou se o cenário era menos idílico do que recordo. Assim a memória alimenta-se de si mesma e julgo que a cada ano que passa sinto essa felicidade mais distante e ainda mais perfeita. Os passos em constante tropeçar ao lado do meu pai, num sorriso que de uma orelha adivinhava a outra, o sorriso da minha mãe numa camisola de gola alta e o meu irmão a rir ao meu lado.
E quanto mais tento recordar, menos nítida é a imagem e mais permanente se torna a emoção. Acho que vestia um casaco azul e umas botas castanhas, ou então era ao contrário: as botas eram pretas e o casaco era branco, ou então era ao contrário: as botas eram invenção e o casaco era azul, ou então era ao contrário: as botas eram invenção e o casaco não me recordo.

Mas afinal, quanto é que realmente guardamos da verdade?


JoaoRui

dezembro 15, 2009

10Anos

Eternos regressos. Regressámos à estrada para celebrar uma década de caminho – ou de sonhos. O caminho não é certo, nunca o foi. Mas fomos sempre em frente, como se não houvera outra maneira, guiados por aquilo que gosto de chamar “a certeza da luz”. No dia doze, tal como há dez anos atrás, regressámos ao principio do desalinho.
Mas dez anos não são assim tantos. É tudo uma questão de perspectiva. O que foram dez anos na grande muralha da china… uns metros apenas, ainda nem metade estava completa – qual metade? É um pouco como nós. Ainda estamos na antecâmara do sonho e ainda não conhecemos o peso dos degraus que vamos construir daqui a dois três cinco, dez anos. O que vai ficando para trás é apenas memória do que fomos. Este momento já é memória e passado.
De certo que os incansáveis obreiros da muralha celebraram se não os dias, então os metros de muro conquistado ou à ausência dele. No dia seguinte retorna-se à argamassa e aos esboços do futuro para se voltar, dali a alguns anos ou dias ou segundos, a celebrar as vitórias onde sem a vontade haveria apenas certeza de vazio.

A vida vai sempre trocar-nos as voltas.

Ao fim deste tempo todo descobri que o que define as pessoas não é a maneira como se levantam depois da queda, mas sim o que dizem quando vão a cair. Então, se o futuro é desconhecido e o presente o último estertor do passado, há que medir bem todas palavras para que estas não se tornem amantes do silêncio.

I’ve got them blues boys!
JoaoRui

Thank you!

Obrigado a todos os que participaram e que vieram celebrar a nossa primeira década. Graças à rubrica “Toca aquela” acabámos por apresentar músicas que já não tocávamos há cerca de 5 anos, como o caso do “Random Lovers” e outras que nunca foram sequer tocadas ao vivo, como o “You’re The One I Want The Most”. Ainda houve tempo para se partir uma harmónica e para regressar ao palco para um encore.
A todos os que participaram, aos que vieram ver o lobo e aos que queriam vir mas não puderam, THANK YOU!
Cá está a set list do concerto:
01 Random Lovers
02 My Kindness
03 You’re The One I Want The Most
04 New Man Waiting
05 Of Those Who Know You’re Right
06 Like The Wolf
07 Leave If You Can
08 A Little Story
09 My Blood
11 Red Pony
12 Lion’s Eyes Louder
13 Dreams & Feathers
14 Leap Of Ignorance
15 Crashing Into The Harbour
(Encore)
16 His Secret











novembro 16, 2009

Desafio ' Toca Aquela '

Festa é festa! E a festa dos 10 anos a Jigsaw vai ser vossa, pessoal. Não há concerto que dêmos que não venham no fim ter connosco dizer “Oh! Queria tanto que tocassem o tema x”. Por isso, desta vez iremos tocar o tema x, o tema y e até o tema w, vocês mandam! O desafio que vos colocamos é o seguinte: oiçam atentamente toda a discografia editada a Jigsaw e enviem uma lista com 5 temas que gostariam de ouvir. Os 10 temas mais votados farão parte da nossa set list do concerto de aniversário. Mas para quê escolher a set list se não vão à festa? Perguntam vocês. Pois perguntam mal! Porque quem participar neste desafio ganha automaticamente 1 convite para o Concerto-Festa de Aniversário! Ora lá está, toca a participar. Deixem a vossa proposta como comentário a este post ou enviem-na para o nosso mail.

Nota: Ainda que não seja exactamente original, a expressão “Toca aquela!” é já um ex-libris do nosso amigo Nuno Ávila, cuja amizade nos acompanha há 10 anos. A ele, portanto, o nosso brinde!

Resultados do Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Respostas correctas:

1. 28 de Novembro de 2008

2. Um barco

3. Gito e Miguel dos Soaked Lamb

4. Contrabaixo

5. Melódica

6. Torres Novas

7. Caixa de Pandora

8. “Mais feelling!”

9. Lua cheia

10. “White Christmas”, Bing Crosby

11. Refere-se à sua voz.

12. Faz malabarismos com as baquetes.

13. 60 anos.

14. Dostoyevsky


Pontuação e Prémios:

1

Luís

14 pontos

Pack 10 anos

2

D. Resende

13 pontos

Discografia + Convite Duplo

3

Cátia Gusmão

13 pontos

Discografia + Convite Duplo

4

Sara Aguiar

13 pontos

Discografia + Convite Duplo

5

Solon

12 pontos

Pack Singles + Convite Duplo

6

Ulis

11 pontos

Pack Singles + Convite Duplo

7

Mariana Silva

10 pontos

Pack Singles + Convite Duplo

8

Zoon

8 pontos

Convite Duplo

9

Gonçalo Moura

6 pontos

Convite Duplo

10

Gustavo

3 pontos

Convite Duplo


Para receberem os vossos prémios, enviem os vossos dados (nome, morada e nº de telefone) para: ajigsawmusic@gmail.com

Muito obrigado a todos os que participaram, parabéns aos vencedores ! Fica desde já encontro marcado para o dia 12 de Dezembro no 'Salão Brazil'. Fiquem atentos ao blog pois haverá mais passatempos e novidades em breve!

Cumprimentos da alcateia ! aaaaaaauuuuuuuuuuuuuuuuuu

novembro 15, 2009

#14 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Este passatempo chega hoje ao fim. Obrigada a todos quantos participaram e aqui vieram diariamente vasculhar o blog. Assistimos a tudo com um grande sorriso, mesmo quando se espalharam ao comprido aí numa ou noutra resposta! ;) Não fiquem tristes, porque já temos mais passatempos preparados para breve, muito breve :D
Quanto aos vencedores, apesar de já todos saberem quem são, informamos que serão aqui divulgados os resultados amanhã. Então, em tom de despedida e com um abraço a cada um, aí vai a última pergunta.
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A propósito do processo doloroso da escolha das músicas para o álbum, é contada a história de um famoso escritor. A quem nos referimos?

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Em estreia absoluta, no nosso myspace, o tema "Down the willow's bed", um dos temas que protagonizou este momento.

novembro 14, 2009

#13 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Os instrumentos, os nossos constantes e fiéis companheiros. Alguns foram por nós acolhidos logo após nascerem, outros tinham já muitas histórias de palcos ou garagens ou sótãos distantes quando chegaram à Casa Azul.
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Que idade tem a lap steel do João Rui?
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novembro 13, 2009

#12 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

De todos os convidados do álbum, o Carlos Ramos, mais conhecido por Mestre, foi aquele que passou mais tempo connosco em estúdio. E não foi só pela proximidade geográfica!! A amizade tem destas coisas… ;)
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O Carlos Ramos é gravado numa situação que provocou algumas gargalhadas. O que faz o nosso amigo?

a) Desafina no coro dos drunken sailors.
b) Faz malabarismos com as baquetes.
c)Rasga a pele do bombo.

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novembro 12, 2009

#11 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

A poesia está sempre presente, na música, nas palavras e na forma como o nosso olhar filtra o movimento dos dias.
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A que se refere o João Rui quando escreve ”Bem-vinda, minha estranha assassina. Nem tudo era saudade…”?
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novembro 11, 2009

#10 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

O aproximar do Natal trouxe às gravações uma energia muito especial, arriscamo-nos a dizer que a magia andou por lá e não era cega!!! ;)
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Qual o nome e o autor da música de Natal que gravámos?
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novembro 10, 2009

#9 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

É curioso assistir a este “blogy-paper” pelo nosso diário de estúdio. Acreditamos que partilhar desses dias e noites de gravação possa adicionar um qualquer bónus de experiência emocional à vossa audição do “Like the Wolf” :)
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O início do Inverno foi passado em estúdio. Qual o estado da lua nessa noite?
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novembro 09, 2009

#8 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

O Miro Vaz, além de ser o nosso produtor, é já um amigo de longa data.

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Qual a frase que o Miro repete sempre que um take não funciona?

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a) “Mais feelling!”

b)“Bebe mais um copo que isso melhora!”

c) “Ui ui! Nem pensar!”

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novembro 08, 2009

#7 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

A certa altura, o Jorri regista neste diário de estúdio: “o Sr. Cash ficou registado para a eternidade, mas para saberem como, depois têm que ouvir o álbum”. A verdade é que ele nunca esclareceu essa história!! Huuuummm…
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Qual o nome familiar que o Jorri dá à caixa das suas percussões?
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novembro 07, 2009

#6 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Na senda dos momentos memoráveis, tiramos do baú este dia do João Rui e a noite que o antecedeu. Vale a pena reler no blog!
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A que cidade foi o João Rui buscar a Becky Lee?
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info: A voz da Becky Lee está presente em dois temas do "Like the Wolf". Um deles, "Return to me", já roda há algum tempo no nosso myspace, mas agora podem guardá-lo convosco, pois está disponível para download.

novembro 06, 2009

#5 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Cada um de nós tem momentos memoráveis empilhados no sótão. Para a Susana, este é certamente um deles! (Alguém ofereça um sótão mais espaçoso a esta miúda!) :D
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Qual o instrumento que a Susana perde na véspera de ser gravado?
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Pista: Este instrumento (não exactamente o que foi perdido, mas o substituto) está presente no tema "Like the Wolf" que se encontrará disponível para download durante as próximas 24 horas. É só passar no myspace da banda!

novembro 05, 2009

#4 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Para além do Coelho da Alice, do Jack e dos nossos convidados, muitos foram aqueles que entraram no estúdio e o aqueceram em sorrisos, música e alguma loucura.
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Qual o nome do “mais recente companheiro” do Jorri?
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info: Pedimos desculpa a todos os que tentaram fazer o download das músicas nos últimos 4 dias e não conseguiram! Para corrigir esta questão colocámos o link directo das músicas para o nosso servidor. Encontram-se na secção "About Me" do myspace. Usem e abusem pois não vão lá estar para sempre! Cumprimentos do lobo.

novembro 04, 2009

#3 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Consideramo-nos pessoas de muita sorte. Tanto no álbum “Letters from the Boatman” como no “Like the Wolf” contámos com a generosidade e com o talento de vários convidados. “They all got the blues!!!”

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Pergunta: "Boas, estamos na A6 quase a chegar a Évora. Qual é a saída para aí?” Quem são os autores desta SMS?

a) Susana Ribeiro e Sofia Silva

b) Gito e Miguel Lima

c) Miro e Carlos Ramos

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info: Já está disponivel para download o tema his secret no myspace da banda!

novembro 03, 2009

#2 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Alguém disse que as coincidências são acasos que fazem sentido.
É confortável acreditar que há uma força superior que se encarrega de brincar com os novelos dos nossos destinos.
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Pergunta: Que objecto esteve parado em frente ao estúdio durante todo o tempo das gravações para nos lembrar que neste puzzle tudo se completa e faz sentido?
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Pista: As questões deste passatempo referem-se ao período de tempo que passámos em estúdio a gravar o álbum “Like the Wolf”.
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info: Encontram-se disponíveis para download os temas Farmhouse e Red Pony durante as próximas 24 horas. É só passar no myspace da banda!

novembro 02, 2009

#1 ::: Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

Abrimos as portas da casa, da nossa casa azul - o espaço sagrado e guardado dos nossos segredos - a quem chega por bem e a quem em boa hora regressa de longe. Esta casa arde às vezes, nós sorrimos sempre, afinal o lobo que ouvimos à noite lá fora nasceu dentro destas paredes. Foi também a esta porta que o barqueiro chegou um dia, e limpou os sapatos a este tapete no dia em que partiu. A canção suspira que o barco zarpou, mas o barqueiro regressa de vez em quando e larga as cartas na soleira da porta. No dia em que rumámos em direcção ao estúdio, abrimos as portas da casa, esvaziámos a nossa casa azul. Chorou a nossa partida, como se a nossa ausência não fora breve, e cantou no dia que regressámos de lobo na alma. É este o espaço de todas as partidas e dos eternos retornos. Das canções sagradas dos nossos segredos. Porque esta casa sorri às vezes, nós ardemos sempre.
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Pergunta: Em que dia começaram as gravações para o álbum “Like the Wolf”?
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Pista: As questões deste passatempo referem-se ao período de tempo que passámos em estúdio a gravar o álbum “Like the Wolf”.

novembro 01, 2009

Passatempo "10º Aniversário a Jigsaw"

É já no dia 2 de Dezembro que celebramos o nosso 10º Aniversário e queremos partilhar esta alegria com todos vocês. Como ainda falta um mês e já estamos ansiosos por festejar, decidimos começar já… amanhã!!!

Assim, nos próximos catorze dias, estarão disponíveis, para free dowload, no myspace, os doze temas que integram o nosso último registo, “Like the Wolf”, e ainda dois temas não incluídos no álbum. Claro que não podem comer os bombons todos de uma vez, que faz mal aos dentes, por isso cada tema estará disponível apenas durante 24 horas. A par deste miminho, que consta que irá embrulhado em fita carmesim, iremos ainda oferecer prémios no passatempo "10º Aniversário a Jigsaw”. Para ganhar, basta conhecer o nosso blog e responder às perguntas que aqui iremos colocando diariamente. Quem responder correctamente a mais perguntas ganhará um Pack 10 Anos, que inclui toda a discografia a Jigsaw (1EP “From Underskin”, 1CD “Letters from the Boatman”, 1CD “Like the Wolf”), 2 t-shirts e 1 convite duplo para a Festa - Concerto de Aniversário, que será dia 12 de Dezembro no Salão Brazil, em Coimbra. Tentador, não é? Mas há mais! A quem responder correctamente a mais de 3 perguntas ofereceremos 1 convite para a Festa-Concerto de Aniversário.

Apanhem este Lobo!! ;)

outubro 13, 2009

Incognita Series I





8 Oct 09
Esta é a primeira das crónicas que surgirão todos os meses em lugares indeterminados, algures entre Glasgow e Lisboa.

Estou no aeroporto de Luton a tentar encontrar as palavras certas para descrever a ânsia que vai tomando conta de mim à medida que me aproximo de “vocês”… mas nada sai, para além de uma mistura de vocábulos em portugalês que não me atrevo a redigir. No meio desta confusão ocorrem-me palavras que nunca confundo – nomes próprios e nomes colectivos e uma série de outras palavras icónicas, como pão, café e sagres.

Voei acompanhada de Kant em busca de uma sensação familiar que me afastasse do medo. De facto, o medo, per si, não constitui um problema – o avião em chamas não me aterroriza; angustia-me mais o amor que a morte – mas facto é que ao questionar os limites da lógica de associação de palavras me deparo com uma série de imagens sem nome próprio que vivem apenas no imaginário colectivo.

Nomes próprios – Mano, João e Susana (perdoa Mané mas ainda estás em portugalês); nomes colectivos – família e amigos. E com isto dizer que perdi a noção de fronteira, que como o meu amante dizia isto de um dia ter a relação mediada por um conjunto de pixéis e no outro estar perto de, a falar com, a tocar, a sentir, a cheirar… distorce a noção de tempo. Não sei agora bem quanto tempo demorarão estes dois anos. Não sei a que horas jantar ou quando parar de trabalhar… e não consigo ouvir música desde que daí parti.

Não vos oiço desde que aqui cheguei. Explico-me a tentar contrariar um sentimento de nostalgia que de momento renego. Se o Lobo tem alguns meses para muitos compreenderão que, para mim, tem anos e histórias de silêncio. Estou ansiosa com o presente e o presente que já me deram foi fazerem-me ouvir de novo. As novas melodias acordaram-me e por isso obrigada!!!
Sofia Silva

outubro 08, 2009

I still have stories to tell :: O Castelo - Franz Kafka

Há sempre uma história engraçada por trás de um livro. Nem que seja o sítio da prateleira de onde se encontrou. Há-de haver pelo menos uma boa história por detrás dessa prateleira. Talvez um bilhete ou uma dedicatória. E se não é aí, então há-de haver alguma nas primeiras páginas do livro.
E já que a vida vai andando em círculos, começo por dizer que detesto maus tratos aos livros: Já que eles são bons amigos, nada justifica a tinta azul a sublinhar passagens nem folhas dobradas. Pelo menos as que não foram dobradas pelo passar incauto das mãos em frenesim à procura do que espera a página seguinte… também há sempre uma boa desculpa para quase tudo.
Antes de prosseguir, detenho-vos apenas no uso da palavra “história” em detrimento de “estória”. “História”, de acordo com os acordos ortográficos, tem uma diferença da “estória”, mas para mim ela não existe: a ausência da dita “estória” dos compêndios de História minimiza-a ou torna-a menos História? Não me parece. Sou dos que hão-de escrever “actor” com “C” até que a loucura me leve o que restar de sobriedade. Se pudesse, escrevia farmácia com PH; é como a minha mãe diz: “esses acordos são para malandros”. Portanto se passar alguma história com ausência de H é culpa do corrector ortográfico e de noites mal dormidas.

Então sigamos para a história de como este livro me veio parar às mãos.

Foi-me passado para elas por um bom amigo meu que me tinha dado boleia até à Praça da República. Ao sair do carro disse “olha cá tens”. Como eu lhe dissera que estava interessado em ler Kafka, agradeci-lhe o empréstimo e fui-me sem demoras.
Já em casa, encontrei a tal dedicatória/nota “I’m 18, I need my heroin. M.A.” fazia sentido, uma dedicatória com parte de uma letra dos Suede (Dog Man Star) já que o meu amigo tinha um gosto particular por eles. Pelo menos tinha-o na altura, antes de partir para a Índia (mas isso é outra história).
Eu vinha de uma fase em que tinha lido praticamente tudo o que pude encontrar em alfarrabistas do Dostoyevsky – sim, alfarrabistas, porque na altura não se entrava numa livraria para comprar livros dele. Ou se comprava “o Jogador” ou então nada feito. Os direitos de edição em solo nacional do espólio do Dostoyevsky estavam na altura em posse da defunta editora “Civilização” (ainda há aqui outra boa história acerca disto com o mesmo amigo M.A. na Feira do Livro em Lisboa).
E é importante frisar de onde eu vinha, porque assim se percebe onde eu me ia meter: é que o Dostoyevsky é torto, mas o Kafka é torto de uma maneira torta. Diabos… as primeiras páginas do “Castelo” deixaram-me no mínimo confuso.
Desisti do livro antes de chegar à vigésima página. Pelo menos tentei… não era para mim. Naquela altura…

Passados alguns dias, talvez semanas, isto para dar o espaço imaginário de reflexão necessária, levei o livro para o devolver ao M.A., agradecendo-lhe outra vez o empréstimo. Mas então ele retorquiu “Esse livro é teu. É a tua prenda de aniversário” e então, rapidamente o meu cérebro fez as adições suficientes de quem não está mais na antecâmara do erro, mas sim de quem comprou o bilhete só de ida para as terras onde ele habita. 2 +2 = 5. Claro, o meu aniversário dos 18 anos tinha sido apenas há semanas… mais uma vez, fazia sentido. Então regressei com o livro a casa e ele a olhar-me de soslaio, com aquele olhar de quem… enfim… sabe o que não devia…
Alguns dias depois voltei à carga, mas dessa vez de peito aberto. E então o livro cicatrizou-me. Ainda hoje me lembro da sensação de cansaço da personagem central, o Joseph K.; das horas que eram dias das viagens que fazia ao Castelo; e talvez seja ele a personagem central... Mais que a história, ficaram-me as sensações. Acho que para mim o Kafka toca-me dessa maneira. E depois, ler cada uma das passagens rasuradas resgatadas ao silêncio pelo eterno “editor” Max Brod que davam ainda mais mil e um sentidos ao Castelo... Não me lanço sobre a própria história que o livro encerra, mas urjo-vos à leitura dele. Tem lá segredos. Tem lá segredos…

E já que a vida anda em círculos, anos mais tarde emprestei o livro a outro amigo, ao R., que numa festa onde também eu (infelizmente) estava, deixou que o livro perecesse dentro de uma taça cuja descrição não avanço para não atormentar a minha memória. E é isso que resta deste livro com aquela querida dedicatória: a minha memória.
Como detesto maus tratos aos livros. Passagens sublinhadas e folhas dobradas…

Joao Rui

outubro 01, 2009

Dia Mundial da Música

© Sofia Silva, Lisboa Andrógina, 2009

Por toda a parte se comemora hoje o Dia Mundial da Música, data tão inspiradora quanto esta luz dourada que perpassa as primeiras folhas secas do nosso jardim. Também a família a Jigsaw se sente inspirada. Inspiram-nos estes dias quentes de Outono, os novos instrumentos que a pouco e pouco vão chegando às nossas mãos, as letras que têm andado à procura de uma canção, as reformas de bricolage a que a Casa Azul tem assistido. E a inspiração, quando nasce, é já a promessa de uma nascitura partilha. Falemos então de partilha e de inspirações sazonais.


A partir de hoje, o nosso espaço irá viver algumas mudanças.


De Glasgow, receberemos mensalmente uma crónica da nossa fotógrafa e amiga e irmã Sofia Silva. Aguardamos ansiosamente o seu olhar, ora ferino ora meigo, em palavras e imagens.


Ao longo do mês, cada quinta-feira acolherá uma rubrica diferente.
Partilharemos as narrativas literárias ou cinematográficas que vão marcando os nossos dias na rubrica “I still have stories to tell”. Porque a vida é lá fora, “I will leave these walls behind” acompanhará os nossos passos fora de casa e sugerirá outros tantos. Do tempo arrancado aos dias que se passam em viagens virtuais, sempre intermináveis, “The endless roads where my feet stand”. E, finalmente, “Hear them on hi-fi stereos” será inteiramente dedicada a essa arte ou bênção ou feitiço a que comummente chamamos música!

Sintam-se confortáveis para entrar e dar uso às nossas poltronas. A garrafa de vinho já está aberta e, daqui a algum tempo, acenderemos a lareira da cozinha. Este espaço é vosso também. O tempo fica lá fora. Entretanto, de braços concentricamente elevados e, entre gargalhadas e olhares de amêndoa, brindemos à música! :)



família a Jigsaw

setembro 02, 2009

Setembro


(Picture by Susana Ribeiro)


Setembro é o mês de todas as partidas. As desejadas e as adiadas, as secretas e as já há tanto anunciadas…

Desenterramos da areia as andorinhas do nosso Abril, largamos ao céu as âncoras de Agosto, abrimos os braços de linho às ondas de Novembro. Sabemos bem que aquele esboço no horizonte poderia ser Ícaro de asas unidas, como lembra o poeta do cachimbo, “para que nenhum sol as desfizesse”.

É de sal a espuma fresca aos nossos pés e de areia macia as lágrimas que guardamos nos bolsos.

Alguém tatuou na pele “A vida não é um destino, é uma viagem”. Alguém espera de malas feitas o próximo voo. Alguém junta letras com a minúcia de quem resolve um puzzle gigante. Alguém arranca papel de parede com os dentes para desventrar o passado. Alguém passa noites em claro a rabiscar uma estratégia bélica a que chamou “Futuro”. Alguém acredita.


É de música salgada cada um dos nossos olhos e não precisamos cruzá-los, porque partilhamos o mesmo horizonte… azul… imenso…

Susana

agosto 23, 2009

Música no sopé da serra


(Pictures by Susana Ribeiro)

Podia dizer "já fui feliz nesta terra" sem qualquer desvio da verdade. Infelizmente desta vez não houve caminhada pelas aldeias serranas, não se escutou o silêncio que vibra em Sto António das Neves, não bebi água fresca na fonte do Terreiro das Bruxas, nem passei pela casa blairwitchiana da Ti Joaquina. Meu deus, quantas memórias à espera de um reencontro... A serra da Lousã é, sem dúvida, um lugar com uma energia muito especial. Foi difícil não soltar o lobo em plena serra, deixá-lo ir... mas, no sopé, havia um palco à nossa espera, amigos já de braços abertos e gargalhadas em lista de espera. Obrigada a todos os que acompanharam o regresso do lobo à estrada. :)

(*Terreiro das Bruxas, eu prometo voltar!)

Susana




save

agosto 17, 2009

"Hi, This is For You"

Photobucket
© Marie van Vollenhoven 2009
O silêncio ou pelo menos parte dele, é boa companhia nos abismos insondáveis da solidão. E há um certo vagar, um certo encanto que só a si pertence – e também – por vezes, nessa sensatez. Se foi o torpor que manietou a tinta durante todos estes dias, então é dele que agora regressamos. Mas ausência não é imobilidade, é certeza de desconhecimento dos filamentos dos segredos. Este hiato junto à porta aberta apressadamente da câmara escura onde vamos revelando cada uma das voltas da agulha com que urdimos as vestes do lobo, terminou agora. Vamos soltar as rédeas do incêndio… como os pirilampos à porta da casa azul. Há tantos anos que não me visitavam estes estilhaços de vida incandescente.
Há tantos anos que me visita esta saudade de não sei bem o quê.
“Tanto quanto sei, vou viver para sempre” dizia ele encostado à porta de saída – como quem aprecia a ironia do tempo perdido; como quem sabe que este pouco tempo que resta é mel de pólen de flores colhidas antes de época – e nisto a imortalidade nada mais que cerra os olhos à nossa condição: somos pó de estrada que mal tempo tem para se habituar aos calcanhares do tempo.
Talvez seja a saudade de não saber mais, ou demais.
Depois de insuflar a casa azul de nova cor, conseguimos condensar uma mão cheia de metáforas numa única divisão: o Pedro atrás de uma lente, sob o olhar atento da Sofia, com o Carlos de tesoura e sorriso em punho criaram os bastidores daquilo que também se chama o vídeo do Red Pony – mas agora adianto-me em demasia, pois isto terá o seu lugar – mas mais adiante.
Então adiante.
Há sempre mais uma história para contar, sobretudo para quem as gosta de guardar: em meados do mês passado, num jardim do qual não sei o nome, perto do museu de história natural, eu e o Jorri, sentados à mesa, mostrávamos pela primeira vez à Sofia a versão final do novo vídeo quando subitamente uma pessoa abordou a nossa mesa. Quase em silêncio, entregou-nos um desenho acompanhado de menos palavras que emoção “hi, this is for you” e eu que abomino o tráfego das grandes cidades, encontrei aqui recompensadas as três passagens em volta do marquês para ali chegar. Só passados dias, talvez semanas, em que o Jorri teve este desenho guardado dentro de um livro é que vi a morada escrita no canto do desenho http://dailydrawing.nl/ . Então, a pessoa do qual havíamos guardado apenas vaga memória de feições tem agora um nome e uma história contada em desenhos e tinta. Outra tinta. Obrigado Marie.
Agora que os pirilampos são tantos que se amassam contra a porta da casa azul, a estrada ganha de novo contornos lúcidos. Vamos regressar aos calcanhares que aqui não se quedam. Ali, à beira da curva, já nos espera o Lobo, que nesta próxima investida nos acompanhará a uma serra próxima. É território dele. É território nosso.
Joao Rui

“When they thought I was running away, I was merely gathering speed, my friend”

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junho 30, 2009

o lobo das neves e a casa azul

olá, alcateia, venho por este meio agradecer-vos por todos os fantásticos momentos que já me proporcionaram, se a descida da montanha em direcção ao vale cortado pelo mondego foi em tempos um risco ou uma incerteza, é agora uma aposta ganha virada para o futuro. Neste mesmo vale encontrei pessoas como eu, dedicadas, humildes e com o BLUS dentro delas :D! Achei na casa azul um novo covil de inspiração, um novo lar e uma nova familia, enfim ... este é o balanço do primeiro trimestre junto da alcateia parece que foi há uma eternidade, mas não ... passou-se foi muito em apenas 3 meses!

obrigado por tudo haauuuuuuuuuuuuuuuuu
ManeThe wolf of the snow and the blue house
Hello Pack, I come through here to thank you for all the fantastic moments that you have given me. If coming down the mountain directed to the valley that's cut by the mondego was in times a risk or an uncertainty, now it's a won bet, turned to the future. In this same valley, i've found people like me, dedicated, humble and with the BLUS inside them :D! I found in the Blue House a new den of inspiration, a new home, a new family, oh well... this is the balance of the first quarter together with the pack. It seems like it was an eternity ago, but no... it was just that so much happened in only 3 months. thank you for everything
haauuuuuuuuuuuuuuuuu

Mane

junho 25, 2009

A Casa Azul #0

Mano bebé

Hoje é um dia como outro qualquer.

Hoje é dia de S. João.

E isto depois de um fim-de-semana comprido, demasiado comprido: com mais segundos do que horas e menos tempo que espaço.

Se o sábado foi da minha ausência para as bandas do mar azul, o domingo foi o de abraçar o azul da casa; De lhe dar novas recordações e lhe agradecer mais uma vez a discrição - sempre que vamos embora parte de nós fica lá dentro. E agora que o tempo passa tão veloz, só tenho a nitidez de anos longínquos que esparsamente me vêm visitar. Agora talvez mais. É a vontade de querer seguir em frente sem nada deixar para trás - eu tenho medo do que posso deixar para trás. E sei que devia ter sempre tudo preparado para partir ainda hoje. Mas se tudo o que somos é passado e promessa de futuro, se eu partir hoje não levo de mim senão promessa de tudo e recordação de nada. E eu tenho medo do que já deixei para trás.

Contou-me a minha mãe que hoje é o aniversário da casa azul: eu tinha seis meses e tudo era promessa.

E hoje que é um dia como outro qualquer

E hoje que é dia de S. João

A casa canta baixinho a voz que eu perdi.

JoaoRui


Blue House # 0
Today is a day like any other.
Today is St. John’s Day
And this after a long weekend, too long: with more seconds than hours and less time than space.
If Saturday was of my absence to the side of the blue sea, Sunday was to embrace the blue of the house; to give her new memories and thank her again for her discretion – whenever we leave, part of us remains inside. And now that the time passes so fast, I can only remember well the distant years that sparsely come to visit me. Maybe more now. It is the desire to want to move forward leaving nothing behind - I'm afraid of what I might leave behind. And I know I should have everything ready to go today. But if all we are is past and promise of future, if I leave today I’ll take from me but promise of everything and memory of nothing. And I'm afraid of what I already left behind.
My mother told me that today is the anniversary of the Blue House: I was six months old and everything was promise.
And today that is a day like any other
And today that is St. John’s Day
The house whispers softly the voice that I lost
JoaoRui

junho 17, 2009

A Casa Azul #5 (by Flávio Torres)

Dia 10-06-2009 Quarta-Feira
Deixo a Beira Interior com destino à casa do lobo, um sol desmaiado acompanha-me nesta viagem curta e expectante rumo a oeste. O asfalto traça as suas linhas a 140Km h seguindo um desenfreado labirinto de vegetação, duas horas depois avista-se a cidade que me espera, “Coimbra”. Após alguns quilómetros, o lobo uiva sem luar e a casa azul surge por entre um terreno verde quente e idolatrável. Ali uma agitação frenética invade todos os presentes, uma equipa prepara o teledisco “Red Pony”, outros aventuram-se em arrojadas tarefas de bricolage, pintura, carpintaria, enfim… a casa azul transforma-se ficando cada vez mais azul. Prepara-se um Churrasco no qual o João é mestre a adicionar um tempero bem picante e acompanhamo-lo com cerveja fresca saborosa. Os trabalhos na casa continuam durante a tarde, no primeiro andar monta-se um mini-estúdio acolhedor num quarto sereno, para que se comece a gravar “The Hill Sessions”. Lá em baixo o frenesim continua dedicado a pormenores, ao cenário do teledisco, e em som ambiente toca um disco de Eels, a música que toca é “Flyswatter”.
O cansaço é notável em todos, pois a meia-noite já se fez soar. Decidimos deixar a casa azul e procurar um recanto que nos sacie o estômago… amanhã é outro dia de magia onde o covil do lobo enfrenta novos desafios.

Dia 11-06-2009 Quinta-Feira

Hoje o dia é quente e sereno, são 11:30 da manhã e encontramo-nos a caminho da casa, é uma viagem de meia hora cheia de boa disposição, com o cheiro do passado que acolhe aquela estrada. Por ali passam pessoas sem modas, que transpiram nos seus passos sem pressa e com remanso. Chegados ao covil, Jorri já se encontra por lá inquieto nas arrumações e limpezas necessárias ao conforto da alcateia, na sala do cenário discutem-se ideias e trocam-se pensamentos elaborados e eu dou uma vista de olhos num Harmonium que se distingue na sala de ensaio, “que som encantador !!!” . O cheiro a churrasco e especiarias invade o nosso apetite e juntamo-nos todos na cozinha para uma boa refeição, o picante está no ponto (João, é assim mesmo!). Seguido de um café, acompanhamos uma abonada bagaceira que nos deu vaidade para comentar o trabalho ali exercido. No decorrer da tarde, dedico o meu tempo a “The Hill Sessions”. A Susana regista o som do seu violino, executando um tom doce/melodioso com um vibrato arrepiante que me deixa iluminado e com poucas palavras. O comboio passa lá fora e os cães acompanham o seu ritmo, ralhando a sua pressa. Por entre a janela, a noite visita-nos o tempo passa a correr….

Dia 12-06-2009 Sexta-Feira
Neste dia, eu e o Mané dirigimo-nos para a casa azul já no final da tarde, com o intuito de por ali pernoitar e trabalhar numa enorme sessão de gravação. Ao chegarmos lá, os afazeres continuavam - João, Jorri e Susana, entre todos os elementos da equipa de filmagem, lá estavam, dedicados às tarefas que o lobo lhes tinha incutido. Após uma boa refeição e um bom dedo de conversa com todos os ajigsawianos, eu e o Mané aportámos no 1º andar para iniciarmos a sessão, o objectivo era incluir percussões e ritmos ao que já estava feito. Entre sons e pormenores criativos, tragávamos gin cola para que o feeling permanecesse daquela forma por muito tempo, e take após take o resultado ia ficando espantoso, fumávamos cigarros atrás de cigarros com um raiar de contentamento. 6 da manhã, o comboio passa, os cães e outros animais ficam agitados com o nascer do dia, ouvem-se já passos no outro lado da estrada. Nós estamos contentes e esgotados, assim como as paredes da casa azul, reclamamos de um bom descanso. Mesmo ali ao lado temos os nossos colchões improvisados a uivarem por nós, não tivemos tempo para mais qualquer tipo de comentário, o sono invadiu-nos completamente…mas lembro-me que dormi feliz.
Dia 13-06-2009 Sábado
Acordámos com um bater penetrante na porta principal de madeira esgotada, olhei para o relógio e passava pouco das 11. Pensava para mim que a minha jornada por ali estava a terminar pois era o meu último dia. Enquanto batiam, uma voz chamava por nós, era o João e o Jorri, já prontos para mais um dia. O Mané desceu para lhes abrir a porta, pois a chave tinha ficado em nossa posse, eu fiquei um pouco mais para acordar em mansidão, aproximei-me da janela e deslumbrei a vista da manhã com um sol radioso. Mais tarde chegou a Susana e o Zé Pedro e por ali almoçámos os seis, pacificamente auxiliados de um café conduzido por uma aguardente e algumas experiências numa resonator. Este sábado dedicámo-lo praticamente a “The Hill Sessions”, Susana inclui mais um instrumento com um som brilhante idêntico a um sino e após essa adição despedi-me do seu encanto. Depois de acomodarmos uma cervejas, João faz magia com a sua voz quente num cover de Johnny Cash e incluímos também harmónica num tema de Bob Dylan. Enquanto a tarde avançava divertiamo-nos muitíssimo com alguns takes interessantes. Cá em baixo Jorri dedica-se à cozinha, presenteando-nos um jantar fabuloso e criativo que fica em segredo (só ele sabe a receita), este assistido por um bom vinho. Ali ficámos os quatro calmamente a provar um conjunto de sabores e a tagarelar sobre vários temas da actualidade, música e leilões… Antes de sair da Casa Azul, passeio pelas suas divisões e transmito para elas o desejo de voltar, Depois disto verbalizo um adeus, um até já, um até sempre. Despedimo-nos com um abraço e com a certeza que mais momentos destes irão surgir. Na memória ficam os bons momentos, as boas pessoas que por ali conheci, a amizade e a música.


A todos vós um desmedido obrigado.
Até breve (rock n roll) !!!
Flávio Torres


A Casa Azul #4

a primeira vez que vi o flávio "tratar da saúde" a uma guitarra, ele partilhava o palco com o nosso mané. lembro-me de pensar "mas onde raio está o resto da banda?!!!" dois tipos em cena, um na guitarra, voz e pratos de choque, o outro no baixo, bombo e tarola, e muita energia, muita cumplicidade, muito rock naquelas veias!! :D lindo!!

na semana passada, o flávio esteve em retiro criativo na casa azul que mais uma vez revelou ser exímia a urdir teias ... as de aranha e as outras, as que se refugiam no pretexto da música para apertar laços...



podem ouvir o flávio

aqui http://www.destilart.com/
e aqui http://www.myspace.com/2duques

;)

Susana

junho 13, 2009

A Casa Azul #3

Chego de manhã. Agora a Casa é um caixote de surpresas com céu e terra lá dentro. Mostram-me as traves mestras, que afinal são de cartão e repenso a história da família que tomou estas paredes de assalto... como se têm vindo a recriar!

Quatro da tarde e as nuvens entram em casa. Cheira a carvão e na mesa estendem-se as dúvidas para mais uma refeição. Esta família vive numa estação imaginária e degusta as gotas que caem como se de um sopro húmido se tratasse...

Agora é Verão. O João pensa no par de calções que vai vestir amanhã. Pensa que a Casa guardará esse segredo.
Agora é Primavera. A Susana pensa nos sapatos que lhe pode oferecer amanhã. Pensa que a Casa agradecerá o presente.
Agora é Inverno. O Jorri pensa nas paredes que tem de voltar a cobrir. Pensa que a Casa beneficiará do conforto.
Agora é Outono. O Mané pensa em despir os telhados para deixar a luz entrar. Pensa que a Casa compreenderá a confiança.

Finalmente de volta, reunidos numa mesa de cozinha. Há cebolas, feijões, abóboras e laranjas à disposição e todo um leque de culturas em fase de plantação. Fala-se do barulho dos instrumentos, dos sons que se registam em silêncio e a Casa insiste em ser o futuro, em dar as respostas que não sabemos querer.

Há quem pinte paredes para creditar o passado, outros há que pintam portas para depois as usar. A lua acende-se antes da noite e a Casa respira de alívio quando percebe que somos mais do que o que trazemos. Eu tomo o ar de volta e abalo. Em jeito de nota lhe explico que sou como gotado de resina de vida que também sei que ela tem.

SofiaSilva

A Casa Azul #2





junho 09, 2009

A Casa Azul #1

Esta semana vai ser inteiramente dedicada ao covil. A ultima vez que a casa viu tantas pessoas de uma só vez eu ainda não tinha suficiente passado para ter memória dele e o presente era uma prenda que agora eu sei que vai ser a minha companhia quando os dias anteriores forem demasiado brancos para deles eu me querer recordar.

Encostado à porta que dá para os lados da cerejeira que já não está lá, ouço os meus passos que aqui passaram no umbral ao regressar a casa; da voz da minha mãe a chamar de longe com uma voz mais parecida com a minha do que esta, do sorriso do meu pai a preencher cada um dos lados do horizonte e dos caules das flores a roçarem nos meus pés.
Devem ser estas lágrimas as que a inocência conhece.

Junto às traves mestras da casa, estas memórias vão-se tornando companheiras da nossa família que agora se une através dos mesmos acordes.
E não há silêncio no esquecimento, há apenas silêncio. E estarmos aqui dentro hoje, as memórias não se calam e já encontraram caminho até mim, até nós e até ao Lobo que nasceu aqui.

JoaoRui

The Blue House #1
This week will be entirely devoted to the den. The last time the house saw so many people at the same time I had not enough past to have memory of it and this was a gift that now I know will be my company when the preceding days are too white for me to want to remember them.
Leaning against the door that leads to the sides of the cherry tree that is no longer there, I hear my steps that passed the door back to the house,; the voice of my mother calling from far with a voice more simillar to my own than this one , the smile from my father filling each side of the horizon and the stems of the flowers rubbing against my feet.
These should be the tears that innocence knows.
Along the cornerstone of the house, these memories become companions of our family that now joins through the same chords.
And there is no silence in oblivion, there is only silence. And we being here today, the memories are not silent and have found their way to me, to us and to the Wolf who was born here.