janeiro 27, 2010

Lisboa em 3 actos (acto III)

Luzes, câmara, não se mexam. E assim permanecemos mudos em fracções de segundo à espera que nos arrastem a alma para dentro de uma caixa de onde espreita uma lente através da qual espreita outra alma que decidiu atrair a nossa para dentro de uma armadilha – e é sempre tarde demais para a trazer de volta. A fotografia agrilhoa a superfície das emoções às histórias que sob ela pulsam, mas de quando em vez o click da máquina coincide acidentalmente com a emoção e aí a alma não é nem roubada nem enganada: é antes seduzida – chama-se “a sedução da vaidade” ao momento em que ela tropeça no beiral dos lábios para nos abandonar o corpo.

Lisboa dos jardins. Aqui são quase tantos como as frestas dos muros por onde se pode espreitar o mar. Com o dia a ameaçar chuva mas a entregar-se em devaneios solares aqui andámos entre ramos mal partidos e clareiras bem iluminadas – à espera que dez olhos encontrassem o momento ideal para nos manter quietos sob o olhar da Rita, que olhava tudo como quem conhece o segredo da sedução.

Os antigos acreditavam que a alma era roubada pela fotografia; eu acredito que é o mar que a leva, mas a vida dá mais voltas que o sangue dentro do coração.

JoaoRui

Lisbon in 3 acts (Act III) Lights, camera, do not move. And so we remain silent in fractions of a second waiting for the soul to be lured into a box where lurks a lens through which lurks another soul who decided to attract ours into a trap - and it's always too late to bring it back. The photography shackles the surface of emotions to the stories that are pulsating beneath it, but from time to time the click of the machine accidentally coincides with the emotion and then, the soul is neither stolen nor deceived: it is seduced - it's called "the seduction of vanity "the moment when she stumbles on the edge of the lips to leave our body. Lisbon of the gardens. Here they are almost as many as the cracks in the walls through where you can peek at the sea. With the day threatening rain, but indulging in daydreams of sun, here we went between badly broken branches and bright clearings - waiting for ten eyes to find the ideal time to keep us quiet, underneath the eye of Rita, who looked upon it all as someone who knows the secret of seduction. The ancients believed that the soul was stolen by the photograph, I believe it is the sea that takes her, but life takes turns more turns than the blood inside the heart. JoaoRui

janeiro 23, 2010

Lisboa em 3 actos (acto II)

Não me canso de repetir: o Chiado é qualquer coisa… a luz baixa que antecede os primeiros acordes, os ouvidos que se sentem antes de pisarmos o palco…

E silêncio… nada me agrada mais que o silêncio de quem ouve e decide partilhar connosco esse momento raro. Thank you…

Ao final da noite, rumámos para as bandas de Benfica onde nos esperavam ainda mais ouvidos que à tarde. Lisboa. Tem de tudo – até silêncio.

Há uns anos escrevinhei umas quantas palavras acerca dele, num caderno comprado numa daquelas tabacarias pequenas e antigas – das que têm tesouros de outros tempos que outro eu de outra época não comprou. Não faço ideia do que é feito desse caderno nem sequer do que o silêncio me falava na altura. Aqui em Lisboa tenho sempre a impressão há sempre uma dessas tabacarias na rua seguinte e nunca sei em qual entrar para procurar o caderno que me vai guardar o silêncio. Desta vez foi diferente, veio até nós: este foi um daqueles dias compridos em que as emoções acompanharam cada pulsar do coração.

Thank you.

JoaoRui

Lisbon in 3 acts (Act II) I don’t get tired of repeating it. Chiado is something… the low light before the first chords, the ears that are felt before we step on stage… And silence… nothing pleases me more than the silence of who listens and decides to share with us that rare moment. Obrigado… At the end of the night we traveled to the sides of Benfica where even more ears were waiting for us than in the afternoon. Lisbon. Has it all – even silence. Some years ago I scribbled down some words about him, in a note book I bought in one of those old and small tobacco shops – of those that have treasures of other times, that another I of another season did not buy. I have no idea of what is of that note book nor even of what silence spoke to me then. Here in Lisbon, I always have the impression that there’s always one of those tobacco shops in the next street and I never know which to get in to find the note book that will keep the silence. This time it was different, he came to us: this was one of those long days where emotions followed each pulsating of the heart. Obrigado. JoaoRui

janeiro 22, 2010

Lisboa em 3 actos (acto I)

Logística. É tudo uma questão de logística. À porta do covil eram mais instrumentos do que o espaço para os levar; mais mãos na cabeça do que a arrumá-los. Mas afinal coube tudo - julgo que não caberia sequer mais uma pandeireta.

Chegamos à cidade sem tempo para a poder sentir. Lisboa é demasiado grande para se ver num só dia. É necessário um bom par de décadas para se conhecer metade e outro tanto para conhecer apenas um pouco mais. Então vamos ficar um pouco mais.

Na “Restart” houve tempo para estrear algumas músicas novas e outras mais antigas. Velhas amigas de seis cordas voltaram a partilhar o palco com o lobo. Há quanto tempo … fazem-me falta… pena não haver sempre espaço. Logística. É tudo uma questão de logística.

JoaoRui


Lisbon in 3 acts (Act I)

Logistics. It’s all a matter of logistics. Outside the den, there were more instruments than the space required to take them; more hands on the head than packing them. But in the end everything fit. I don’t think we could slip there even one more tambourine.

We arrive the city without time to feel it. Lisbon is too big to be seen in just one day. One needs a good pair of decades to know just half and just as much to know just a bit more. So we’ll stay a bit more.

In “Restart” there was time to debut some new songs and some older ones. Old six stringed friends shared the stage with the wolf one again. It’s been so long… I miss them. It’s a shame there’s not always enough room. Logistics. It’s all a matter of logistics.

JoaoRui

janeiro 19, 2010

Crónicas de Glasgow #2

© Sofia Silva, November 4th, da série Exaurir, 2009



© Sofia Silva, November 5th, da série Exaurir, 2009


Ouve-se que em Portugal um ano novo começou, mas neste lugar frio tudo custa mais a arrancar…

Volto e vou deslizando no gelo à espera do cenário certo, da luz suficiente, de um espaço que seja também um pouco meu ou a que eu consiga, pelo menos, chegar. Uma vez mais, os sonhos permitem encher os dias de esperança. Nos últimos tempos confesso que a família tem tomado conta da imaginação, suponho que resultado de andar a conviver com os álbuns de família. Acontece que as memórias que nunca existiram se começam agora a construir, com a liberdade de quem assegura conhecer os personagens e lhes dá espaço.

Muito disto é saudade, mas acrescento que muito deste espaço onírico é aliado de uma procura angustiante por uma ideia de uma fotografia, uma ideia de um projecto, uma ideia de algo que possa extravasar as minhas barreiras, traduzir o corpo da minha carne e falar por mim.

Se muita coisa acontece quando laureamos o trabalho para fora do país, uma delas é a certeza de que há trilho mais além. Se o que levamos na mala vale, o que podemos acrescentar também, mas nada será mais precioso que a ideia de uma bagagem ausente que possamos inventar.
Sofia Silva
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I hear a new year started in Portugal, still in this cold place everything seems harder to initiate…

I return and get sliding above the ice waiting for the right scenery, for enough light, for some sort of space I can call my own or where I can at least arrive. Once again, dreams allow me to fill the days with hope. These last days family took over my imagination, probably as a result of being around family albums. It so happens that inexistent memories begin to have some shape, with the same freedom one gives to the character one trusts and recognizes so well.

Much of this is saudade, though I add that a lot of this oneiric space is an ally of an anguish demand for an idea, for a photograph, for a project, something that could go beyond my own boundaries and translate the body my flesh is made of and speak for me.

If a lot happens when we take our work abroad, one thing is for sure the reiteration that there’s a path to walk beyond. If what we carry in our baggage is worth it, so will be whatever we can add to it, still nothing will be more precious than the idea of an absent luggage we might come up with.
Sofia Silva

janeiro 18, 2010

Breyner 85

De novo no Porto. As ruas parecem-me mais familiares – as estradas apertadas contra os prédios como se fora contra a vontade destes e só aos pés fosse permitido caminhar entre eles. O Breyner 85 é uma casa antiga com um tecto a perder de vista e um piano ao canta da sala à espera… à espera… os pianos parecem estar sempre à espera… são irmãos pacientes. Julgo que já aqui estive, que conheço a madeira das portas e ela soubesse os meus segredos. Os corredores tornam-se mais estreitos como se me quisessem devolver aos segredos. E crescem degraus de cada vez que subo as escadas, ou são os pés que ficam mais pesados de reencontrar passos antigos e gestos que não são de agora. Há qualquer coisa particularmente comovente nas casas antigas. E nunca é acerca do presente, é sempre sobre o passado. Então quando passo a entrada é como encontrar a minha vida inteira. A minha mãe falou-me do responso de Stº António; falou-me também que coisa perdida que atravesse água já o responso perde a autoridade. Quando atravesso um rio, lembro-me disto e que provavelmente aqui perdi alguma coisa, ou então que foi na outra margem – volto sempre uns metros atrás na ponte e olho as margens à procura de passos da coisa perdida. Mas nada… ainda não a encontrei, nem ela a mim.

JoaoRui


Again in Oporto. The streets seem more familiar to me - the roads pressed against the buildings as if it were against their will and only feet could walk between them.Breyner 85 is an old house with an out of sight roof and a piano in the corner of the room waiting ... waiting ... pianos always seem to be waiting ... they are patients brothers. I think that I’ve already been here, that I know the wood of the doors and she knows my secrets.The hallways become tighter as if they wanted to return me to the secrets. And each time I climb the stairs the steps seem to grow, or maybe the feet become heavier rediscovering old steps and gestures that are not of today. There is something particularly poignant in old houses. And it is never about the present, it’s always about the past. So when I cross the entry it’s like finding my whole life. My mother told me of the prayer of St. Antonio; she also told me that the lost thing that goes over the water, the prayer loses its authority. Whenever I cross a river, I remember this and that I probably lost something here, or maybe it was on the other side – So I walk back a few yards over the bridge and look at banks of the river looking for the steps of the lost thing. But nothing ... Nor I have found her, nor she has found me.

JoaoRui

European Tour starts... now!!

Breyner 85, Janeiro de 2010


janeiro 01, 2010

Bom dia, 2010!!!

Temos um pé ainda a levantar voo de 2009 e o outro já a aterrar em 2010, é tempo de balanços e de promessas, de recomeços e de esperança.

2009 foi um ano cheio para nós, com o lançamento e promoção do álbum “Like the Wolf”, a gravação do vídeo do tema “Red Pony” e a celebração do 10º Aniversário da Banda. Foi ano de conhecer muito boa gente e de estreitar laços, ano de esticar também a corda, às vezes, para testar os nossos limites pessoais…
Mas 2010 não lhe vai ficar atrás! Tem vindo a ser cozinhado em banho-maria há já algum tempo, por isso é esperado por todos com extremo optimismo. E é com este espírito que o novo ano nos chega às mãos, de malas feitas e passaporte pronto a ser estreado, com a esperança de novas terras, novos amigos, novos palcos, e a bússola da música sempre a nortear os nossos gestos. Há ainda muitas surpresas na manga, mas cada uma será revelada e partilhada convosco a seu tempo. ;)

Hoje é dia de dizer "Bom dia!” ao novo ano e de brindar com os amigos!

Por isso, a ti, que sempre vens aqui ler os nossos textos e nem te conhecemos; a ti, que ouves a nossa música; a ti, que te apaixonaste pela nossa música; a ti, que sempre nos apoias; a ti, que não perdes um concerto; a ti, que nunca perdes um concerto e ficas sempre na euforia da primeira fila; a ti, que nunca perdes um concerto e ficas sempre na timidez da última fila; a ti, que compreendes que a música é a nossa vida; a ti, que és inspiração; a ti, que és o amor; a ti, que és a saudade; a ti, a ti e a ti, um imenso OBRIGADO e o desejo sincero de um grande Ano Novo!!!


Bom dia, 2010!!! :D
a Jigsaw