Dia 10-06-2009 Quarta-Feira
Deixo a Beira Interior com destino à casa do lobo, um sol desmaiado acompanha-me nesta viagem curta e expectante rumo a oeste. O asfalto traça as suas linhas a 140Km h seguindo um desenfreado labirinto de vegetação, duas horas depois avista-se a cidade que me espera, “Coimbra”. Após alguns quilómetros, o lobo uiva sem luar e a casa azul surge por entre um terreno verde quente e idolatrável. Ali uma agitação frenética invade todos os presentes, uma equipa prepara o teledisco “Red Pony”, outros aventuram-se em arrojadas tarefas de bricolage, pintura, carpintaria, enfim… a casa azul transforma-se ficando cada vez mais azul. Prepara-se um Churrasco no qual o João é mestre a adicionar um tempero bem picante e acompanhamo-lo com cerveja fresca saborosa. Os trabalhos na casa continuam durante a tarde, no primeiro andar monta-se um mini-estúdio acolhedor num quarto sereno, para que se comece a gravar “The Hill Sessions”. Lá em baixo o frenesim continua dedicado a pormenores, ao cenário do teledisco, e em som ambiente toca um disco de Eels, a música que toca é “Flyswatter”.
O cansaço é notável em todos, pois a meia-noite já se fez soar. Decidimos deixar a casa azul e procurar um recanto que nos sacie o estômago… amanhã é outro dia de magia onde o covil do lobo enfrenta novos desafios.
Dia 11-06-2009 Quinta-Feira
Hoje o dia é quente e sereno, são 11:30 da manhã e encontramo-nos a caminho da casa, é uma viagem de meia hora cheia de boa disposição, com o cheiro do passado que acolhe aquela estrada. Por ali passam pessoas sem modas, que transpiram nos seus passos sem pressa e com remanso. Chegados ao covil, Jorri já se encontra por lá inquieto nas arrumações e limpezas necessárias ao conforto da alcateia, na sala do cenário discutem-se ideias e trocam-se pensamentos elaborados e eu dou uma vista de olhos num Harmonium que se distingue na sala de ensaio, “que som encantador !!!” . O cheiro a churrasco e especiarias invade o nosso apetite e juntamo-nos todos na cozinha para uma boa refeição, o picante está no ponto (João, é assim mesmo!). Seguido de um café, acompanhamos uma abonada bagaceira que nos deu vaidade para comentar o trabalho ali exercido. No decorrer da tarde, dedico o meu tempo a “The Hill Sessions”. A Susana regista o som do seu violino, executando um tom doce/melodioso com um vibrato arrepiante que me deixa iluminado e com poucas palavras. O comboio passa lá fora e os cães acompanham o seu ritmo, ralhando a sua pressa. Por entre a janela, a noite visita-nos o tempo passa a correr….
Dia 12-06-2009 Sexta-Feira
Neste dia, eu e o Mané dirigimo-nos para a casa azul já no final da tarde, com o intuito de por ali pernoitar e trabalhar numa enorme sessão de gravação. Ao chegarmos lá, os afazeres continuavam - João, Jorri e Susana, entre todos os elementos da equipa de filmagem, lá estavam, dedicados às tarefas que o lobo lhes tinha incutido. Após uma boa refeição e um bom dedo de conversa com todos os ajigsawianos, eu e o Mané aportámos no 1º andar para iniciarmos a sessão, o objectivo era incluir percussões e ritmos ao que já estava feito. Entre sons e pormenores criativos, tragávamos gin cola para que o feeling permanecesse daquela forma por muito tempo, e take após take o resultado ia ficando espantoso, fumávamos cigarros atrás de cigarros com um raiar de contentamento. 6 da manhã, o comboio passa, os cães e outros animais ficam agitados com o nascer do dia, ouvem-se já passos no outro lado da estrada. Nós estamos contentes e esgotados, assim como as paredes da casa azul, reclamamos de um bom descanso. Mesmo ali ao lado temos os nossos colchões improvisados a uivarem por nós, não tivemos tempo para mais qualquer tipo de comentário, o sono invadiu-nos completamente…mas lembro-me que dormi feliz.
Dia 13-06-2009 Sábado
Acordámos com um bater penetrante na porta principal de madeira esgotada, olhei para o relógio e passava pouco das 11. Pensava para mim que a minha jornada por ali estava a terminar pois era o meu último dia. Enquanto batiam, uma voz chamava por nós, era o João e o Jorri, já prontos para mais um dia. O Mané desceu para lhes abrir a porta, pois a chave tinha ficado em nossa posse, eu fiquei um pouco mais para acordar em mansidão, aproximei-me da janela e deslumbrei a vista da manhã com um sol radioso. Mais tarde chegou a Susana e o Zé Pedro e por ali almoçámos os seis, pacificamente auxiliados de um café conduzido por uma aguardente e algumas experiências numa resonator. Este sábado dedicámo-lo praticamente a “The Hill Sessions”, Susana inclui mais um instrumento com um som brilhante idêntico a um sino e após essa adição despedi-me do seu encanto. Depois de acomodarmos uma cervejas, João faz magia com a sua voz quente num cover de Johnny Cash e incluímos também harmónica num tema de Bob Dylan. Enquanto a tarde avançava divertiamo-nos muitíssimo com alguns takes interessantes. Cá em baixo Jorri dedica-se à cozinha, presenteando-nos um jantar fabuloso e criativo que fica em segredo (só ele sabe a receita), este assistido por um bom vinho. Ali ficámos os quatro calmamente a provar um conjunto de sabores e a tagarelar sobre vários temas da actualidade, música e leilões… Antes de sair da Casa Azul, passeio pelas suas divisões e transmito para elas o desejo de voltar, Depois disto verbalizo um adeus, um até já, um até sempre. Despedimo-nos com um abraço e com a certeza que mais momentos destes irão surgir. Na memória ficam os bons momentos, as boas pessoas que por ali conheci, a amizade e a música.
A todos vós um desmedido obrigado.
Até breve (rock n roll) !!!
Flávio Torres
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