março 24, 2011

O som da pele [Recording Sessions]

Apropriamo-nos de horas menos próprias para entregar estes murros silenciosos contra a pele curtida. Ali dentro da sala vazia, ouve-se o som abafado das baquetas que violentamente penetra as paredes desta casa. Ouvimos continuamente as palavras que sobrevoam a fita e recordamo-nos do que aqui nos trouxe.
E nem há sol ou pôr-do-sol. Não há lua nem nuvens, nem estrelas. Há um silêncio que perdura em tudo, mas que aqui não pertence. O som da pele é um grito que não é abafado nem é um desabafo. É um sem número de palavras que clamam resgate do nosso corpo. Que queriam ser ouvidas mas que apenas terão direito ao estrondo que embala os minutos e os segundos que se amassam à porta do que permitimos.
João Rui

The sound of skin - we take for our own less proper hours to deliver these silent blows against the tanned leather. There, inside the empty room, one hears the muffled sound of drumsticks that violently penetrate the walls of this house. We hear the words continually flying over the tape and we remember what brought us here. And there is neither sun nor sunset. There are neither clouds nor moon, nor stars. There is a silence that lasts in all, but that does not belong here. The sound of the skin is a scream that is not muffled and neither is it a rant. It is an endless number of words that call redemption from our body. That wanted to be heard but that only will be entitled to the bang that cradles the minutes and seconds kneading by the door of what we allow. João Rui

março 09, 2011

A quatro (pares de) mãos [Recording Sessions]

Aqui, na serra de S. Mamede, trabalha-se de sol a sol... ou será de lua a lua?! É que perdemos constantemente a noção do tempo!! Um dia destes mostramo-vos a beleza natural que temos por vizinhança lá fora, mas hoje é dia de conhecerem um bocadinho do caos organizado que é a nossa casa-estúdio. Quarta foi dia de pausa nas gravações para preparar os próximos concertos. Têm sido dias a quatro pares de mãos, mesmo quando só se ouve um instrumento dentro do estúdio, mesmo quando um de nós desceu à cidade para comprar pão fresco, ainda que só um esteja ao leme, entre ondas sinusoidais e arpões de sons.
Susana

Photo: João P. Miranda
With four (pairs of) hands - Here, in the hills of S. Mamede, we work from sun to sun ... or is it from moon to moon?! It’s that we constantly lose track of time! Some other day we will show you the natural beauty that we have for a neighborhood out there, but today is the day for you to know a little more of the organized chaos that is our home studio. Wednesday was a break day from recording to prepare the next concerts. The days have been of four pairs of hands, even when only one instrument is heard in the studio, even when one of us went down to the town to buy fresh bread; even though only one is at the helm of sinusoidal waves and harpoons of sounds. Susana

março 08, 2011

O violino [Recording Sessions]


Os músculos estão quentes e fazem estalar a madeira madura. Tens dedos e tens ouvidos. Cortaste as unhas para que mais facilmente as cordas te cortem os dedos? Calma, Inspira. A música não nasce dos dedos, muito menos estas canções, é ao coração que deves vassalagem. Espera, mas o coração não é um músculo? Então fecha os olhos e concentra-te num ponto, focagem, zoom, ou então suavemente deixa que tudo fique difuso, até à perfeição. A tua memória é a caixa de ressonância mais que perfeita destas canções, por isso Respira. Relês o que deve ser esquecido, queimas o que devias ter estimado e limpas mais uma vez a resina que se vai agarrando às cordas. Qual é afinal o teu sonho? É para responder rápido, evita usar palavras! Há tantas vozes neste navio, tantas quanto a verdade que teima em cantar e queimar-te os dedos, o único artifício é o teu medo. Sossega, esse violino não é teu. Há muito que o barqueiro o levou, há muito que um lobo lhe vela o sono. A nova enseada pode devolver-te o que procuras, por isso, antes do próximo clique de metrónomo,
Inspira. Expira… (alguém espera alguém no cais) … Respira.
Susana

Photo: João P. Miranda

The violin - The muscles are warm and they crack the ripe wood. You you have fingers and ears. Did you trim your nails so that the strings would cut your fingers more easily? Relax, Breathe. The music is not born out of the fingers, much less in these songs. It’s to the heart that you owe allegiance. Wait, but is the heart not a muscle? So close your eyes and concentrate on one point, focus, zoom, and then gently let everything be diffuse, unto perfection. Your memory is the resonance box more than perfect of these songs, so breathe. You read once more all that should be forgotten; you burn what you should have kept and you clean once more the resin that clings to the strings. What is your dream after all? You must answer fast, avoid using words! There are so many voices in this vessel, as many as the truth that insists in singing and burning your fingers. The only artifice is your fear. Calm down, this is not your violin. It’s been a long time since the Boatman took it. For a long time the wolf has been watching over its sleep. The new shore might give you back that what you seek, so before the next click of the metronome, inhale, exhale … (someone is waiting in the pier) … breathe. Susana

março 06, 2011

A permissão [05.03.2011 Tocha]

Há quanto tempo me faltava o chão onde os segredos são ditos sem meia voz.
Com a chuva a fustigar a estrada que nos levou à Tocha, regressámos ao palco de onde nos ausentámos desde Outubro.
Sussurramos as novas canções porque ainda não é hora de as arrancar do peito. Talvez apenas uma... lembrei-me da Bretanha onde algumas delas foram pela primeira vez apresentadas. Suponho que assim seja a partir daqui. Vamo-nos recordando a espaços onde elas foram tocadas pela primeira vez. Como o My Funny Valentine em Italia.
Como o passar do tempo as recordações vão-se moldando ao que delas permitimos.
João Rui

Photo: Tiago Cação
The permission - For how long I have missed the floor where secrets are told without a half-voice. With the rain tearing at the road that tooks us to Tocha, we returned to the stage from where he had been absent since October. We whisper the new songs because it is not yet time to tear them from our chests. Maybe just one... I remembered of Britain, where some of them were first presented. I suppose it's the way it goes from here. From time to time we remember where they were first played. Like My Funny Valentine in Italy. With the passing of time, the memories shape themselves to what we allow of them. João Rui

março 04, 2011

Respirar Debaixo D'Água [03.04.2011 Coimbra]

Depois de uma semana embrenhados em cordas de guitarra e outras mais que entregámos à fita, chegou a hora de um pequeno interlúdio de regresso a uma promessa antiga que finalmente se concretizou: musicar o filme "Respirar Debaixo D'Água" do António Ferreira no Teatro Académico Gil Vicente. Assim, sentados no palco ao lado de uma tela que nos iluminava as cordas e as teclas, colorimos o filme com outros sons que o António nem sequer imaginava quando o criou. Curiosa a sensação de irrepetibilidade desta ventura, onde cada nota foi pensada, cronometrada e sentida para apresentar a nossa visão do filme.
Obrigado António. "Foste tu, não foste?"
João Rui


Respirar Debaixo D'Água - After a week wrapped up in guitar strings and others that we have delivered to the tape, it was time for a brief interlude, back to an old promise that finally happened: doing the live music of the movie "Respirar Debaixo D'Água" of Antonio Ferreira at the Teatro Académico Gil Vicente. So, sitting on stage next to a screen that lit up the strings and keys, we colored the film with other sounds that Antoio did not even imagined when he created it. There was a curious feeling of uniqueness in this venture, where each note was thought, timed and felt, to present our vision of the film on stage. Thank you Antonio. "Foste tu, não foste?" João Rui